Esse espanto

E a título particular o que é que a impressionou?
Eu vivia numa família, pertencia a um meio em que as casas estavam arrumadas. Não se deixava que viessem visitas sem a casa estar arrumada. De repente, começo a entrar na casa dos meus colegas e amigos ingleses e estava sempre tudo desarrumado. Ninguém arrumava porque eu ia lá a casa. Tudo isto é parte da mesma cultura. Aqui, na Lisboa desses anos, havia o sentimento do “parece mal”. Lá, nada parecia mal. A atitude é contagiosa. 

Era como se não houvesse o dentro e o fora. Quando o fora chega, apanha o dentro como o dentro está. 
Claro. Não há dentro e fora. É-se. To be. Estava a dizer isto ontem a um colega: os cientistas hoje não leram Shakespeare, não sabem Filosofia. A sociedade pergunta: “Faz isso para quê?” As coisas têm de ser para alguma coisa. Sobretudo na Biologia, que está perto da Medicina. [Investigação] para quê? Para tratar doenças, para isto, para aquilo. Para a empresa, para…

(…)

É. Depois a vida é muito mais simples. É como um rio. Se vir a origem dos rios, impressiona. A origem do Tejo ou do Volga é uma coisinha. Nem se percebe como dá aqueles rios enormes. A imagem do rio é a da vida. A única escolha do rio é que não tem escolha: vai por ali fora, por onde a montanha deixa. No rio humano, fazemos escolhas. Tirando isso, gosto mais da metáfora do rio do que da narrativa. 

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